quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Guerra Junqueiro – Poesia e Verdade

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Dormirão? oh, nunca!…vão eternamente
Circular na eterna vida universal:
Nebulosa fluida, labareda ardente…
cuadro01ampgrandville………………………………………………………. 
E o pastor de ovelhas, que comeu centeio…
Já liberto agora da Ilusão do mundo
Fez-se em anjo branco, ainda outra vez pastor:
Milhões de astros seguem seu olhar jucundo,
São rebanhos de almas pelo azul profundo,
As ovelhas novas do Ti Zé-Senhor!buyerguardianangel 
Homem!
Dá pelo Amor ao triste e ao desvalido
Teu coração, teu pão e teu vestido!
Pelo Amor, com teus lábios virginais
Beija lepras e cancros de hospitais!
Pelo Amor, pelo Amor, como Jesus,
Sorri à Dor pregado numa Cruz!
segundav «Guia-me apenas, distante,
A luz ingénua da Crença,
Vaga nebulosa errante
Nas trevas da noite imensa…»
the_creatorpint-levy06 «Embarquei nessa nau de epopeia e má sorte,
Argonauta cantando, a alma heróica em flor!…
Dentro ninguém!… Sozinho, a descrever-lhe o Norte,
À proa um capitão gelado e mudo, – a morte,
à popa um timoneiro, olhos de abismo, – a Dor!…»
sirens3509 «Tu, átomo de pó, que encaras face a face
A eternidade, tu, Prometeu resoluto
Que pesas na tua mão, onde mal cabe um fruto,
Quantos mundos a arder Deus arrojou no espaço,
…………………………………………………………………………………asas2 
cuadro02ampDizei, dizei-me tu, ó débil criatura,
Em frente dessa eterna imensidade obscura
Onde, águia, o teu olhar é um carvão apagado,
Que é que desejas, diz, Prometeu fulminado,
Qual a tua ambição, teu ideal incoercível?oloboeocordeiro
- É ser ou lodo inerte ou rochedo impassível!»  
«E ao pender-vos gelada a fronte alabastrina
Irá levar a Deus o vosso coração,
Tão manso e virginal, tão novo e tão perfeito,
Que Deus há-de beijar e aquecer no peito,
Como se acaso fosse uma pomba divina,
Que viesse cair-lhe exânime na mão.»arvore
«Formas da matéria, que eu em vão desnudo,
Que invisíveis forças e almas encobris?
Quem o sabe? A Morte, que conhece tudo…
Mas o enigma impresso no seu lábio mudo
Só na treva aos mortos é que a morte o diz!…»
«Só a Morte o sabe… mais a Fé que abrasa,
Que penetra as coisas com o seu olhar!
Não há fé na alma, não há luz na casa…
A razão é um verme, mas a crença é asa…
Verme, aos infinitos poderás chegar!…»vesalius
«Deus! o terrível problema!
Quando a Ciência chega aqui,
Ou emudece ou blasfema
A língua do bisturi.
E a ideia mortiça e vaga
Expira dentro do crânio,
Como uma luz que se apaga
Nas trevas dum subterrâneo.
e a musa vendo-se então
Sozinha na noite imensa
Entre um naufrágio – a Razão,
E um salva-vidas – a crença,
Procura, fugindo à Morte,
O doce olhar de Jesus,
Como o íman procura o norte
E o cego procura a luz»119753
«No Infinito mudo tua ingénua crença,
Trémula ceguinha de risonho alvor,
Eis-a andando, andando, como que suspensa,
Pelos descampados duma noite imensa,
Vastidões de assombros, amplidões de horror!…
E onde a águia, o génio de pupila o vante,
Tem vertigens, auras, desfalece e cai,
A ceguinha débil, vagabunda, errante,
De olhos às escuras, infinito adiante,
Num enlevo áureo perpassado vai!…»bala1
«Onde a alma, origem dessas formas belas?
Em tão várias formas que sonhou dizer?
Qual a ideia, ó alma, convertida nelas?
E desfeito o encanto, que nos não revelas,
Que aparências novas tomará teu ser?
Noite escura!…enigma!…Ai, do que eu preciso,
Boeirinha linda, linda, linda de encantar,
É dessa inocência, desse paraíso,
Da alegria de oiro que há no teu sorriso,
Da candura de alva que há no teu olhar!…»
Dentro da alma dela, triste campo santo,
Muitas almas vivem mortas a sonhar!…
Vivem mortas, mudas, num dorido encanto…
st-michel……………………………………………………………………… 
Ai dos pobres mortos que não têm fogueiras,
Nem velhinhas santas que lhes dêem luz!
cuadro03cuadro04………………………………………………………………………
Desses desgraçados, mortos no abandono,
Onde estão as almas? Para que Deus as fez?
Quando o vento uivando lhes perturba o sono
Pela treva errantes, como cães sem dono,
Andarão perdidas a ulular talvez!…»

cuadro05

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